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terça-feira, fevereiro 28, 2006

artigo jornal "A Guarda" , 23 Fevereiro 2006


Tomba o “GIGANTE” Miuzelense


“Eu já previa que isto fosse acontecer”.
Esta foi a expressão mais ouvida, no passado fim-de-semana, entre as gentes da Miuzela. O maior ser vivo que habitava a aldeia, possante, da família das Pináceas, uma gimnospérmica com um perímetro de 4,40 m na base do tronco e cerca de 20 m de altura, Pinus Pinea, conhecido entre nós como o “Pinho Redondo”.
Monumento vivo, de referência obrigatória, elemento indispensável em qualquer postal ilustrado e parte na história da Miuzela.
A terra tremeu por volta das 20:00 h do dia 18 de Fevereiro.
Com cerca de 2 séculos de existência serviu para muitas brincadeiras e recordações entre os miuzelenses. De folha persistente e tronco direito cilíndrico de casca muito grossa e coloração castanho avermelhada. As folhas são agulhas verde claras, agrupadas duas a duas, rígidas, com 10 cm de comprimento e 1 a 2 mm de grossura. As pinhas estão isoladas ou agrupadas em 2 ou 3 de cor pardo castanho-avermelhado, e escamas com um pinhão de 15 a 20 mm de comprimento. Florescia de Março a Maio libertando os pinhões perto do final do período escolar, no verão, pois era onde se ia passar o resto da tarde depois das aulas. Sentados na relva, à sombra da sua grande copa arredondada, semelhante a um guarda-chuva, a comer pinhões e contar-lhe as nossas venturas e desventuras.
Parece que os elementos da natureza estavam revoltados, contra o estado de indiferenças que reina na aldeia. Ventos a soprar com toda a raiva, terrenos amolecidos pela água onde as raízes outrora se cravavam, o manto escuro da noite deixava a árvore sozinha sem que ninguém a pudesse acudir e as imagens e sons das televisões abafavam os murmúrios de socorro.
O “Pinho Redondo” tombou.
Depois de séculos a lutar contra as intempéries e agruras do tempo, foi vítima da acção (ou melhor omissão) do homem. “Eu já previa que isto fosse acontecer”. Não era apenas um mau presságio era a constatação de um facto. Todos sabíamos o que se estava a passar mas poucos, ou ninguém, fazia alguma coisa. Parece que era preciso um tema de conversa e que só com a sua queda se poderia arranjar.
Um projecto de construção foi aprovado.
Louva-se a coragem de um jovem casal miuzelense querer construir o seu lar e a sua vida na Miuzela, atitude esta que merece o apoio incondicional de todos, principalmente pelas instituições.
A falta de terrenos em boas condições de acessibilidade para construção de habitações, escasseiam na Miuzela, pois ou se encontram em mãos de pessoas que não querem vender ou em posse de herdeiros de antigos Senhores Feudais.
Durante muitos anos esteve à venda, mas a ideia que ninguém iria construir (ou ter a coragem de construir) naquele local, despreocupou o povo e os seus representantes políticos.
Agora o pinho caiu e não houve tenta surpresa quanto isso. A projecção da Miuzela no conselho tem vindo a perder importância. A perda sofrida é sinal deste estado de desinteresse, apatia e abandono.
Apesar da quarta povoação mais populosa a dinâmica e a pujança de outrora, quando ao grito “Miuzela Arriba” ninguém nos parava, são agora recordações saudosas.
Será que os nossos representantes políticos não puderam fazer nada?
Será que era a vontade do povo que ao lhes entregar o poder assinar de cruz o abate do “Pinho Redondo”? Será que continuam a ter a mesma legitimidade para o exercício do cargo para que foram eleitos?
Quando se fala em poder político, este não se resume apenas à Junta de Freguesia, mas alargado também a uma figura desconhecida de alguns, que é a Assembleia de Freguesia (órgão deliberativo por excelência). Este também com elevadas responsabilidades, pois é este órgão que confere os poderes ao presidente da junta. Será que alguma vez soubemos o que se passa nas reuniões da Assembleia de Freguesia e se estas ao menos decorrem conforme os termos da lei? E o que fazem os elementos da minoria (vulgo oposição) nessas assembleias. Será que defendem os seus pontos de vista e que desempenham o cargo com empenho e exigência que lhe são inerentes. Esperemos que sim.
Esperemos que em casos de grande importância para o povo, caso a Assembleia de Freguesia não se sinta capaz de tomar uma decisão de tal responsabilidade, que consultem o plenário de cidadãos, para que seja o povo a decidir.
Não podemos, também, deixar de parte os órgão municipais, em especial, a Câmara do nosso concelho, que bem intencionada é quando precisa mas que logo após se esquece dos seus objectivos de desenvolvimento sustentável e preservação do património passando a seguir (talvez) objectivos puramente economicistas e interesses pessoais (vulgo dinheiro). Afinal de contas foi ela que permitiu e licenciou a construção.
Será que ela (Câmara Municipal de Almeida) sabia o que aquele “pinhozeco” representava para nós?
Nunca pensou a minha geração em assistir a tamanho desleixo pelo património da aldeia. È altura para que todos façamos um exame de consciência.
Será que a Miuzela, a grande Miuzela, está a esmorecer, desanimar, enfraquecer.
Será que está a deixar-se ultrapassar pelas aldeias vizinhas, com pujança e ideias vencedoras.
Será que devemos ficar indiferentes, desinteressados, apáticos.
Continuar com as nossas vidas como se nada tivesse acontecido.
Mexer com as nossas emoções e recordações sem termos uma palavra a dizer.
NÃO!!
É preciso agir, agitar, mexer, actuar, activar.
É altura da Miuzela voltar a ser grande, enorme, imponente, colossal. É altura de voltarmos a levar bem alto a nossa cultura, o nosso nome, a nossa paixão, o nosso orgulho. É altura de voltar-mos a gritar a pulmões bem cheios “Miuzela Arriba”.

Tomba o GIGANTE, esperemos que não tenha sido em vão…

1 Comentários:

Blogger Celina disse...

Por curiosidade, tentei ler este texto aqui no blog - mas é impossível.
Não acham que é melhor pô-lo de maneira a que se possa ler?

6:01 da tarde

 

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